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Foto do escritorGeovanne Solamini

Tramas paralelas ofuscaram o drama de Helena em Mulheres Apaixonadas

Helena ofuscada e o forte merchandising social marcaram a novela de 2003

Imagem: Reprodução/TV Globo

Diferentemente de suas irmãs mais velhas, “Por Amor” (1997) e “Laços de Família” (2000), “Mulheres Apaixonadas” pode ser considerada uma novela experimental de seu autor, Manoel Carlos. Atualmente entrando na fase final de sua reprise pelo Canal VIVA, a novela tinha os elementos clássicos de um folhetim do “manecoverso”, mas dessa vez, não era a Helena – aqui, vivida por Christiane Torloni – que movimentava a história central, mesmo que ela se movimentasse por todos os núcleos, segurando a barra de todos que a cercavam: os alunos e funcionários da escola em que era diretora, o condomínio onde morava, suas irmãs, seu filho e só em último plano, seus amores.

Com cerca de 70 atores fixos no elenco, foram os coadjuvantes que acabaram marcando a memória do público. Não por uma possível falta de talento de sua protagonista, mas sim pela falta de história, o que fazia com que outros núcleos ganhassem mais destaque. Ao contrário das novelas anteriores de Maneco, as tramas paralelas de “Mulheres Apaixonadas” cativaram mais a audiência do que os dramas de Helena, uma mulher moderna, dinâmica e sobrecarregada, dividida entre César (José Mayer), um amor do passado, e seu marido Téo (Tony Ramos), que esconde muitos segredos dela.


Em alguns momentos, a fórmula “crônica urbana carioca” da novela dava a impressão de ser arrastada e com acontecimentos pontuais. Mas por outro lado, foi uma novela muito importante para a TV brasileira. Mesmo com os velhos conceitos presentes em tramas do autor, como elitismo, machismo e racismo, ela desempenhou um grande papel de acender um sinal de alerta na sociedade com os problemas que ali eram retratados. Vale lembrar as questões sociais representadas na novela de 2003.

Alcoolismo

Vera Holtz como a professora Santana, viciada em álcool | Foto: Reprodução/TV Globo

Um dos maiores problemas presentes na sociedade brasileira era representado pela professora Santana (Vera Holtz). Com dependência alcóolica, a personagem comovia o público com as dificuldades de lidar com seu vício, enquanto prejudicava a si mesma e as pessoas à sua volta. Cenas de Santana bebendo escondido (de bebidas alcoólicas a perfume) ficaram marcadas no imaginário do público, se tornando memes com o surgimento das redes sociais.

Violência contra a mulher

Raquel (Helena Ranaldi) e Marcos (Dan Stulbach) em uma das cenas de violência contra a mulher na novela | Foto: Reprodução/TV Globo

Através do casal Raquel (Helena Ranaldi) e Marcos (Dan Stulbach), “Mulheres Apaixonadas” falou abertamente sobre a violência doméstica. Ela, professora de educação física, se muda para o Rio de Janeiro afim de fugir de seu marido violento, mas acaba sendo encontrada por ele, dando início a uma série de agressões emocionais e físicas – muitas delas incluindo uma raquete de tênis, que chocaram e marcaram a memória o público.


Raquel chega a denunciá-lo, mas pouca coisa é feita, denunciando a fragilidade no sistema de proteção à mulher no Brasil. A influência da novela causou um aumento expressivo nas denúncias, fazendo com que canais fossem criados ou modernizados para ajudar as vítimas. No mesmo ano, uma lei instaurou o Ligue 180, destinado exclusivamente para denúncias de violência doméstica.

Relacionamentos abusivos

Heloísa (Giulia Gam) e Sérgio (Marcello Antony) | Foto: Reprodução/TV Globo

A pauta era representada pelo casal Heloísa (Giulia Gam) e Sérgio (Marcello Antony). Ela tinha crises de ciúmes excessivas e era descontrolada quando se tratava da sua paixão. Ao longo da história, Heloísa passou a frequentar reuniões de um grupo de apoio chamado de Mulheres que Amam Demais Anônimas (MADA), até então desconhecido do grande público, que visava ajudar mulheres que viviam desta forma.

Maus tratos contra idosos

Oswaldo Louzada, Regiane Alves e Carmen Silva | Foto: Reprodução/TV Globo

Uma das histórias mais marcantes e comoventes da novela foi do casal Flora (Carmem Silva) e Leopoldo (Oswaldo Louzada). Artistas aposentados, eles vivem, com o filho Carlão (Marcos Caruso) e sofrem com as maldades da neta Dóris, o grande papel da carreira de Regiane Alves.


Antipática e bastante grosseira, enxergava os avós como um fardo em sua vida. Com frequência os maltratava e até roubava dinheiro deles. A personagem ficou marcada pela cena que apanha de cinto do pai por suas atitudes cruéis.

Violência cotidiana

Vanessa Gerbelli como Fernanda na famosa cena do tiroteio no Leblon | Foto: Renato Rocha Miranda/TV Globo

Sem dúvida, a cena mais marcante da novela é o tiroteio no Leblon onde Téo (Tony Ramos) e Fernanda (Vanessa Gerbelli) são vítimas de balas perdidas, resultando na posterior morte dela. Isso tudo ocorreu enquanto o Brasil discutia a elaboração do Estatuto do Desarmamento, que mudou as regras de porte e posse de armas em 2003. Houve um grande engajamento na campanha e foi gravada até uma cena de passeata, com os atores protestando contra as armas.

Homossexualidade

Clara (Alinne Moraes) e Rafaela (Paula Picarelli) | Foto: Reprodução/TV Globo

O preconceito contra pessoas LGBTQ+ foi abordado por meio das personagens Clara (Alinne Moraes) e Rafaela (Paula Picarelli). Jovens estudantes, elas formam um casal delicado e sofrem preconceito através dos pais de Clara, que não aceitam o seu relacionamento de sua filha com outra mulher, e também pela colega de escola Paulinha (Roberta Gualda), moça amargurada e moralista, que soltava frases preconceituosas contra o casal. No último capítulo houve uma espécie de beijo quando as mesmas interpretavam Romeu e Julieta na peça exibida na formatura dos alunos do colégio.

Câncer de mama

Hilda (Maria Padilha) em uma das consultas de seu tratamento de câncer de mama | Foto: Reprodução/TV Globo

Já na reta final, Manoel Carlos repetiu o tema de sua novela anterior de forma mais sutil quando Hilda (Maria Padilha), a irmã do meio de Helena (Christiane Torloni) e Heloísa (Giulia Gam) acaba descobrindo um pequeno nódulo em um dos seios. Nesse meio tempo, ela passa por cirurgias e sessões de quimioterapia, onde as cenas serviram de apresentação e conscientização de uma das doenças mais presentes entre as mulheres brasileiras. Debates que traziam informações sobre o tratamento, a relação com a família e também a cura.

Valeu a pena ver de novo!


Em resumo, Mulheres Apaixonadas é uma boa novela e está valendo a pena ver de novo pelo Canal VIVA. A discussão desses temas 18 anos após a sua estreia é muito positiva e a novela vem fazendo sucesso nas redes sociais, apesar da justa problematização de abordagens e diálogos que não funcionariam nada bem no Brasil de 2021.


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