Mães são figuras constante nas séries, filmes, livros e especialmente nas novelas, sendo muitas vezes o personagem principal ou de maior popularidade entre o público. A importância da figura materna no consciente coletivo brasileiro é tão grande que isso se reflete em seu produto audiovisual mais consumido (principalmente pelo público feminino e, em sua maioria, mães) e exportado mundo afora. Elas são representadas quase sempre como uma figura sagrada, cuja relação com os filhos e netos são fundamentais para a vida – mas assim como na vida real, existem exceções. Essa vasta gama de mães desperta todo tipo de sentimento do público, seja pelos gestos feitos por amor que levantam discussões até hoje, seja pelas maldades que nos deixam horrorizados. A imperfeição da figura da mãe é algo bem recorrente na vida, e nas novelas não é diferente: a ficção nos ajuda a entender mais sobre essa pessoa fundamental para nossas vidas.
Biológicas, adotivas, solos… neste texto, vamos relembrar algumas das mães mais marcantes das novelas, sejam elas boas ou não. Começamos com as mãezonas que marcaram a TV:
Helena (Vera Fischer) – Laços de Família (2000)
Difícil escolher uma das Helenas de Manoel Carlos para essa lista. As vividas por Regina Duarte (em “História de Amor” – 1995, “Por Amor” – 1997 e “Páginas da Vida” – 2006) e Lílian Lemmertz (em “Baila Comigo” – 1981) são lembradas até hoje pelos sacrifícios muitas vezes questionáveis que fizeram pelos filhos, biológicos ou adotivos.
Mas a escolhida para essa lista é Vera Fischer em “Laços de Família” (2000). Viúva, mãe de Fred (Luigi Baricelli) e Camila (Carolina Dieckmann), Helena abre mão de seu amor pelo jovem médico Edu (Reynaldo Gianecchini) quando percebe que sua filha também o ama, permitindo que ela viva esse amor.
Mais tarde, e mais uma vez, Helena abre mão de seu amor maduro por Miguel (Tony Ramos) para salvar a vida da filha. Portadora de leucemia, Camila só poderá sobreviver com a doação de medula de um irmão do mesmo pai e da mesma mãe, o que obriga Helena a revelar um grande segredo: Camila é fruto de uma traição de Helena com seu primo, Pedro (José Mayer), de quem ela engravida mais uma vez para salvar a filha.
Helena abdica diversas vezes da própria felicidade em prol da felicidade da filha, mesmo que, muitas vezes, ela não mereça.
Maria do Carmo (Susana Vieira) – Senhora do Destino (2004)
Aguinaldo Silva é especialista em criar figuras maternas de grande sucesso popular, e essa é apenas a primeira da lista. Susana Vieira destoava do estereótipo de madame rica ao viver Maria do Carmo, uma mãe tipicamente brasileira.
Nordestina, forneceu uma vida confortável para si e para os quatro filhos no Rio de Janeiro com muito trabalho, esforço e determinação, sempre transmitindo muito amor para todos à sua volta, não apenas os filhos, como também noras, netos, amigos e funcionários.
Apesar de tanto amor, Do Carmo carrega consigo a dor de ter tido sua única filha mulher, Lindalva (Carolina Dieckmann), roubada de seus braços assim que chegou ao Rio, justamente no dia mais trágico da Ditadura Militar. Do outro lado, está Nazaré Tedesco (Renata Sorrah), que roubou Lindalva, rebatizando-a de Isabel, uma representação exagerada da mãe narcisista, possessiva, e até assassina.
Depois de mais de 20 anos de busca incessante por sua filha perdida, Do Carmo a reencontra e então sua batalha será finalmente reconstituir sua família. Quem não ama uma história como essa?
Lurdes (Regina Casé) – Amor de Mãe (2019)
Mães procurando filhos perdidos recebem uma simpatia especial do público. A prova é o retorno de Regina Casé às novelas, após quase 20 anos afastada do formato, num papel escrito especialmente pra ela pela autora, Manuela Dias.
Apesar de dividir o protagonismo com Adriana Esteves e Taís Araújo, Regina foi o grande nome de “Amor de Mãe”, com sua composição cheia de delicadeza e realismo, fazendo-nos esquecer que se tratava de uma personagem de novela, tamanha a semelhança com mães e avós reais. Assim como Maria do Carmo, Lurdes é uma mulher nordestina, mãe de cinco filhos, mas um deles, Domênico, foi vendido pelo próprio pai, fazendo com que a personagem parta em direção ao Rio de Janeiro para reencontrá-lo.
Quase 30 anos depois, Lurdes finalmente encontra seu Domênico: ele é Danilo (Chay Suede), filho de sua falsa melhor amiga, a possessiva e superprotetora Thelma (Adriana Esteves), que o comprou após perder seu filho biológico num incêndio. Dona Lurdes foi um personagem muito bem construído, fiel ao representar muitas mães pelo Brasil a fora, e apesar de fazer parte de uma novela densa e sem um núcleo cômico bem definido, Lurdes também nos fez rir muitas vezes, dividida entre a dor e alegria de toda mãe real.
Dulce (Cássia Kiss) – Morde & Assopra (2011)
Um dos melhores trabalhos de Cássia Kis nas novelas foi a pobre Dulce nesta comédia romântica contemporânea e interiorana de Walcyr Carrasco. Humilde, sofrida e batalhadora, Dulce trabalha como faxineira e vende cocadas para sobreviver e sustentar os estudos de seu único filho, Guilherme (Kléber Toledo), que esconde da mãe que não estuda e finge ser rico no Rio de Janeiro.
Quando volta à pequena cidade de Preciosa, Guilherme engana não apenas a mãe, mas também os moradores da cidade, fingindo ser formado em medicina e ser filho de pais ricos, disposto a dar o golpe do baú na filha do prefeito. Dulce era constantemente humilhada pelo filho, que a renegava e tinha vergonha dela, causando a revolta do público. Mas Dulce nunca desistiu dele, por pior que ele fosse.
Griselda (Lilia Cabral) – Fina Estampa (2011)
Mais uma vez, Aguinaldo Silva criava uma protagonista de muito sucesso e apelo popular. Mesmo nascida em Portugal, Griselda era uma clássica mãe brasileira que sustentava a si, aos três filhos e o neto trabalhando como “marido de aluguel”, ou seja, fazendo diversos serviços de manutenção doméstica.
Sua humildade, falta de vaidade e comportamento masculinizado (ela é chamada de “Pereirão” pelos amigos e clientes) causa vergonha em um de seus filhos, o ambicioso estudante de medicina Antenor (Caio Castro), que chega a contratar uma atriz para fingir ser sua mãe para a família de sua namorada rica – na época da exibição original, Aguinaldo chegou a acusar Walcyr Carrasco de plágio, tamanha a semelhança com a trama de Dulce e Guilherme em “Morde e Assopra”, mesmo que “Fina Estampa” tenha estreado nesse depois.
Mais uma representação da mulher e da mãe brasileira, que podemos encontrar em todo lugar. Uma mulher forte, batalhadora e honesta que consegue se dar bem na vida com o fruto do seu trabalho e sacrifício – mesmo que, em certo momento da novela, uma vitória de milhões de reais na loteria seja muito bem-vinda.
Mas também tivemos mães que não eram tão boas assim...
Odete Roitman (Beatriz Segall) – Vale Tudo (1988)
Uma das maiores vilãs da teledramaturgia brasileira, eternizada por Beatriz Segall, a maldade de Odete também se estendia aos seus filhos. Ausente, fria e controladora, Odete manipulava até os parceiros que seus filhos escolhiam, fazendo com que Afonso (Cássio Gabus Mendes) se case com Maria de Fátima (Glória Pires) apenas como uma forma de fazê-lo ir embora do Brasil, país que ela tanto detesta, e fazendo com que a problemática e alcoólatra Heleninha (Renata Sorrah) se casasse com um homem que a não a ama, Ivan (Antônio Fagundes), seu funcionário.
Ela é especialmente crítica e cruel com Heleninha, a quem considera fraca e incapaz, chegando a usar o alcoolismo da filha para que recaísse sobre ela a culpa da morte de seu outro filho, Leonardo, causada pela própria Odete. O acerto de contas entre as duas, horas antes do emblemático assassinado de Odete, é uma das melhores cenas da teledramaturgia brasileira.
Flora (Patrícia Pillar) – A Favorita (2008)
A figura central e grande vilã da novela de João Emanuel Carneiro utilizou a maternidade para iniciar o seu plano de vingança contra Donatela (Cláudia Raia), sua ex-amiga e ex-parceira numa dupla sertaneja. Depois de cumprir pena após assassinar Marcelo (Flávio Tolezani), Flora retorna e tenta reconquistar a filha que supostamente teve com ele, Lara (Mariana Ximenes), que acabou sendo criada por Donatela.
Mas na verdade, Flora detesta a filha, a quem chamava de “purgantezinho”, e usava sua reaproximação somente para botar na mão na fortuna da família de Marcelo. Patrícia Pillar conseguiu imprimir na personagem uma personalidade doce e introvertida, onde a pobre mulher com tristeza nos olhos nos surpreendeu com uma diabólica vilã.
Branca (Susana Vieira) – Por Amor (1997)
Um dos melhores papéis da carreira de Susana Vieira, Branca era uma mãe nada fácil de lidar. Rica e arrogante, tem relações problemáticas com os três filhos, cada um à sua maneira. Idolatra Marcelo (Fábio Assunção) por acreditar que ele é filho de Atílio (Antônio Fagundes), seu grande amor do passado, e não de Arnaldo (Carlos Eduardo Dolabella), com quem mantém um casamento de aparências.
Com Milena (Carolina Ferraz), vive um cotidiano e enfrentamentos e disputa pela atenção de Arnaldo, ainda que Branca tente controlar a vida da filha a todo custo, inclusive sabotando cruelmente o relacionamento dela com um rapaz mais humilde.
Leonardo (Murilo Benício), o mais novo, é totalmente desprezado e humilhado pela mãe, e é justamente através dele que o destino dá um grande golpe em Branca: na verdade, é justamente Léo, o patinho feio da família, o filho que Branca teve com Atílio.
Magnólia (Vera Holtz) – A Lei do Amor (2016)
Depois de ter interpretado a mãe Lucinda em “Avenida Brasil” (2012), um símbolo da figura materna, Vera Holtz interpretou o extremo oposto com Magnólia. Uma mulher dura e autoritária, era tida como uma santa pelos moradores da fictícia São Dimas, mas em casa era o contrário.
Conservadora, moralista, e consequentemente hipócrita, Mag não media esforços para manter a boa imagem de sua família, chegando até mesmo a cometer assassinatos. Porém, a maior de suas maldades foi a manipulação que realizava com sua filha mais nova, Vitória (Camila Morgado), para que ela e nem ninguém soubesse que Magnólia mantinha um caso com o genro Ciro (Thiago Lacerda), quase que prostituindo Vitória.
Magnólia entra para a lista das piores e mais desalmadas mães da teledramaturgia e foi o grande destaque da novela, que não foi bem sucedida.
Eva (Ana Beatriz Nogueira) – A Vida da Gente (2011)
Ardilosa e manipuladora, Eva era mãe da tenista Ana (Fernanda Vasconcellos), que a sustentava, e também de Manuela (Marjorie Estiano), a quem Eva rejeitava abertamente por conta de um defeito na perna.
Abandonada pelo marido rico, vive assombrada pela pobreza e humilhação do passado, e teme que todos os sacrifícios que fez pela carreira de Ana tenham sido em vão, e por isso controla todos os passos da filha, tornando-se implacável quando descobre que a filha engravidou.
Seu excesso de controle seria justificável e até perdoável, se Eva não fosse tão cruel com Manuela e com sua própria mãe, a doce e sábia Iná (Nicette Bruno), a verdadeira figura materna das meninas.
Ao desenrolar da novela, Ana sobre um acidente, entra em coma, e Manuela assume a criação de sua filha Júlia (Jesuela Moro) ao lado do pai da menina, Rodrigo (Rafael Cardoso), fazendo com que Eva tenha um ressentimento ainda maior pela filha mais velha, a quem culpa pelo acidente, e a quem acusa de ter roubado a vida de Ana. Quando Ana finalmente acorda do coma, muitos anos depois, Eva acredita que finalmente terá de volta seus dias de glória, mas está muito enganada.
Ainda falando sobre mães, vale relembrar daquelas que fizeram grande sucesso nas séries, como Dona Nenê (Marieta Severo) na segunda versão de “A Grande Família” (2001-2014) e Dona Picucha (Fernanda Montenegro) em “Doce de Mãe” (2013-2014).
E claro, essa é mais uma data para homenagear a grande Nicette Bruno, que deixou o seu legado na TV brasileira com suas mães e avós que marcou gerações, como por exemplo a Dona Lola na segunda versão de “Éramos Seis”, exibida pela extinta TV Tupi em 1977, e nas atuais reprises de “TiTiTi” (2010), no Vale a Pena Ver de Novo, e em “A Vida da Gente” (2011), em edição especial às 18h na TV Globo.
Você sabia?
Segundo a matéria exibida neste sábado (08) no programa “Se Joga”, da TV Globo, a atriz que mais interpretou mães na emissora foi Laura Cardoso. Ela já atuou como mãe em 21 novelas e já foi mãe de grandes nomes da nossa TV, incluindo Vera Fischer em “Brilhante” (1981), Marcos Palmeira na segunda versão de “Irmãos Coragem” (1995), Tony Ramos em “Felicidade” (1991) e “Caminho das Índias” (2009) e Glória Pires em “Mulheres de Areia” (1993). Fala se não é uma mãezona que merece todo nosso amor e admiração? E pra você, qual é a melhor e a pior mãe da teledramaturgia?
Assista aqui, a matéria que rolou no programa: https://globoplay.globo.com/v/9500169/